Na década de 90, a viagem para a ponta da península de Karpas fazia-se através de uma estrada estreita com pouco mais de um metro de largura, e levava um dia inteiro. Tínhamos de conduzir lentamente para evitar os numerosos buracos. Esta estrada primitiva e em mau estado protegia ao mesmo tempo a natureza deste parque natural.
À chegada aguardava-nos uma vasta extensão de areia e o mar azul que se perdia no horizonte. Ficávamos em contato exclusivo com a natureza. A paisagem intacta provoca uma sensação muito forte de pureza e relaxamento.
À noite as estrelas irradiavam um brilho intenso que só naquele local podíamos observar.
Para trás ficaram as últimas pessoas que tínhamos visto na aldeia de Rizokarpaso que fica na estrada que conduz ao mosteiro do Apostolos Andreas.
Esta viagem poderá brevemente ser feita num par de horas através de uma nova estrada de 10 metros de largura entre Rizokarpaso e o mosteiro de Andreas Apostolos. Para tal foram derrubadas inúmeras alfarrobeiras, oliveiras e árvores de zimbro. Foram além disso efetuadas terraplanagens em duas encostas referenciadas pela Natura 2000 como importantes locais de nidificação para aves migratórias. Perante os protestos, as “autoridades” locais decidiram limitar para 6m a largura da nova estrada.
Infelizmente muitos dos moradores de Rizokarpaso, maioritariamente colonos provenientes da Turquia, são instrumentalizados e não valorizam os benefícios de viver num verdadeiro paraíso natural. As autoridades ocupantes não sensibilizam a população para a proteção ambiental. Entendem que a nova estrada trará benefícios e turistas que desenvolverão as atividades locais. Esses caciques argumentam que a atual estrada provoca muitos acidentes, estraga os pneus e os veículos.
O “prefeito” de Rizokarpaso, Mehmet Demirci, teve o desplante de apoiar a “necessidade urgente” da nova estrada para facilitar a realização de “um grande festival” de música Techno no próximo mês de Setembro. Este evento é promovido por um empresário turco, prevendo-se que atrairá mais de oitenta mil pessoas a uma área natural com um ecossistema muito sensível.
O biólogo Hasan Sarpten, em artigo publicado num jornal cipriota turco, recordou a importância e singularidade da área sublinhando que das 1 410 espécies identificadas que vivem em Chipre, 75 por cento vivem na Península de Karpas. Há mais flora e fauna selvagens por metro quadrado em Karpas do que em quilómetros quadrados de outras partes do país.
Dos 47 tipos de plantas endémicas de Chipre, 24 só podem ser encontradas lá. Doze dos 16 répteis sob proteção também são nativos desta área, tal como 147 dos 215 tipos de aves.
Em suma, dos 238 tipos de fauna encontrada em Chipre, 166 habitam na Península de Karpas. Um dos mais importantes locais de assentamento de tartarugas verdes encontra-se também em Karpas.
Focas-monge do Mediterrâneo, também conhecidas por lobos-marinho, um dos membros da família das focas mais ameaçado de extinção, com apenas cerca de 400 indivíduos referenciados, visitam regularmente a costa de Karpas.
O biólogo alerta que num curto espaço de tempo, este bastião da natureza em Chipre será dramaticamente afectado se a nova estrada vier a ser construída.
Notícias
Karpas, um paraíso ameaçado.
O biólogo Hasan Sarpten alerta que este bastião da natureza em Chipre será alterado se a nova estrada for construída.